sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

MENSAGEM DE BARUCH SPINOSA 1665: ESTE É O DEUS DE SPINOSA

Se Deus tivesse falado, ele teria dito:
“Para de ficar rezando e de bater no peito! O que eu quero é que saias pelo mundo e desfrutes de tua vida. Eu quero que gozes, cantes, te divirtas e que desfrutes de tudo o que Eu fiz para ti.

Para de ir a certos templos lúgubres, obscuros e frios que tu mesmo construíste e que acreditas ser a minha casa.

Minha casa está nas montanhas, nos bosques, nos rios, nos lagos, nas praias e no coração das pessoas. Ali é onde eu, de fato, vivo e ali expresso meu amor por ti.

Para de me culpar da tua vida miserável: eu nunca te disse que há algo mau em ti ou que eras um pecador, ou que tua sexualidade fosse algo mau.

O sexo é um presente que eu te dei e com o qual podes expressar teu amor, teu êxtase, tua alegria. Assim, não me culpes por tudo o que te fizeram crer.

Para de ficar lendo supostas escrituras sagradas que nada têm a ver comigo.

Se não podes me ler num amanhecer, numa paisagem, no olhar de amigos, nos olhos de teu filhinho. Sim, me encontrarás em um bom livro, uma poesia, uma obra de arte e, quem sabe, em um mendigo.

Confia em mim e deixa de me pedir. Tu me dirás como fazer meu trabalho?

Para de ter tanto medo de mim. Eu não te julgo, nem te critico, nem me irrito, nem te incomodo, nem te castigo. Eu sou puro amor.

Para de me pedir perdão. Não há nada a perdoar. Se Eu te fiz, eu te enchi de paixões, de limitações, de prazeres, de sentimentos, de necessidades, de incoerências, de livre-arbítrio. Como posso te culpar se respondes a algo que eu pus em ti? Como posso te castigar por ser como és, se eu sou quem te fez?

Crês que eu poderia criar um lugar para queimar todos meus filhos, pelo resto da eternidade, porque não se comportaram bem? Que tipo de Deus poderia fazer isso?

Esquece qualquer mandamento, qualquer tipo de lei; essas são artimanhas a fim de manipular-te, para te controlar - que só geram culpa em ti.

Respeita teu próximo e não faças o que não queres para ti. A única coisa que te peço é que prestes atenção a tua vida, que teu estado de alerta seja teu guia.

Esta vida não é uma prova, nem um degrau, nem um passo no caminho, nem um ensaio, nem um prelúdio para o paraíso. Esta vida é o único que há, aqui e agora; isto é único de que precisas para crer em mim e receber da vida.

Eu te fiz livre, isto é, relativamente responsável. Não há prêmios nem castigos. Não há pecados nem virtudes. Ninguém preenche um placar. Ninguém leva um registro. Tu és condicionalmente livre para fazer de tua vida uma dádiva ou uma ameaça, um céu ou um inferno.

Eu não te posso dizer se há algo depois desta vida, mas posso te dar um conselho. Vive como se não o houvesse... Como se esta fosse tua única oportunidade de existir, de aproveitar, de amar. Assim, se não há nada, terás aproveitado da oportunidade que te dei, sendo correto e vivendo feliz.

E se houver, tem certeza de que eu não te vou perguntar se foste comportado ou não. Só vou te perguntar se tu gostaste: se te divertiste e do que mais gostaste? O que aprendeste? O bem que fizeste?

Para de apelar para mim - isto é supor, adivinhar, imaginar. Eu não quero que, assim, acredites em mim. Quero que me sintas em ti. Sim, quero que me sintas em ti quando beijas tua amada, quando agasalhas tua filhinha, quando acaricias teu cachorro, quando tomas banho no mar.

Para de me louvar! Que tipo de Deus ególatra tu acreditas que eu seja? Aborreço-me quando me pedem desculpa. Canso-me quando me agradecem. Tu te sentes grato? Basta isto.

Para de complicar as coisas e de repetir como papagaio o que te ensinaram sobre mim. A única certeza é que tu estás aqui, que estás vivo e que este mundo está cheio de maravilhas.

Demonstra-o, cuidando de ti, de tua saúde, de tuas relações, do mundo. Te sentes olhado, surpreendido, admirado? Expressa tua alegria! Este é o jeito, o único, de me louvar. Entendeste?

Para que precisas de mais milagres? Para que tantas explicações? Não me procures fora! Não me acharás. Procura-me dentro de ti, nos outros, nas coisas e, sobretudo, nas relações que vives. Aí é que estou, sempre estarei, abraçado contigo.

BARUCH SPINOZA
Filósofo

1632 – 1677

terça-feira, 21 de janeiro de 2014

A COR DA FÉ – RELAÇÕES ESTREITAS ENTRE INTOLERÂNCIA, RAÇA E RELIGIÕES DE MATRIZ AFRICANA

Casos de intolerância religiosa registrados no país subiram de 15 para 109 entre os anos de 2011 a 2012.
Quando escuto notícias do tipo “Evangélicos tentam invadir terreiro em Olinda” ou “Traficante evangélico proíbe terreiros no Morro do Dendê”, me pergunto se os lideres religiosos estão realmente passando a mensagem escrita na bíblia ou se as pessoas se cegam diante de intolerâncias medíocres construídas outrora. Cresci num lar protestante e, mesmo me identificando hoje com religiões de matriz africana, faço questão de guardar mensagens para refletir episódios diversos na vida.

Lembro que o princípio teológico regente do cristianismo é a salvação pela fé, numa operação feita pelo Espírito Santo “… pela graça sois salvos, mediante a fé; e isso não vem de vós é dom de Deus” (Ef 2:8). Diante disso, pergunto a alguns que se dizem cristãos: por que tomam o lugar de Deus tentando converter os outros a suas verdades se o próprio livro sagrado que seguem não lhes permite convencer ninguém? Não seria mais interessante exercer amor ao invés de perseguirem outras crenças? Parece-me que alguns estão muito ocupados com seu próprio umbigo, tão ocupados que só pensam na própria “prosperidade”. A ironia e a cegueira são tantas que destruir um templo umbandista e mantê-lo de portas fechadas é plausível ou ignorável, mas se torna um absurdo a forma como alguns países tratam os cristãos. Não percebem os fanáticos que incorrem no mesmo erro.
Os casos de intolerância religiosa registrados no país pelo “Disque 100” – ouvidoria vinculada à Secretaria de Direitos Humanos – subiram de 15 para 109 entre os anos de 2011 a 2012, sendo os representantes de religiões de matriz africana os mais atingidos. O motivo não poderia ser mais óbvio, em momentos anteriores da história, homens e mulheres africanos foram demonizados por teorias em voga no medievo, consequentemente suas crenças e cultura não escaparam desse olhar disforme que se propaga até os nossos dias. Vários documentos medievais referentes à África reforçam a ideia de que era uma terra corrompida, a terra onde “Satã se enfiou após a queda”, e para completar, interpretaram seus habitantes como os descendestes de Can – o filho de Noé amaldiçoado a servir eternamente seus irmãos (OLIVA,2008). Se você, leitor, se lembrou de Marco Feliciano não foi por acaso, é exatamente essa exegese medieval utilizada pelo indivíduo para justificar a “maldição” da pele negra. Ao fecharmos essa conta o resultado não é somente a moralização da cor da pele, é também a hierarquização das crenças de acordo com suas origens.
Impossível não dizer, por exemplo, que a destruição da imagem de Yemanjá em João Pessoa e em outras cidades não seja consequência da propagação dessas interpretações errôneas sobre as tradições africanas. Afinal, por que os kardecistas não sofrem tanto com a intolerância se comparados aos os umbandistas e candomblecistas? Por que não têm seus espaços invadidos e destruídos? Simples, por mais que ambas partam do princípio da existência de seres encarnados e desencarnados o kardecismo tem origem europeia, tem um “cânone”, um “código de ética”.
Minha esperança é que nesse dia 21 de janeiro (Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa) nossa dívida uns para com os outros não seja a destruição dos símbolos que importam a cada um em suas crenças, mas sim “o amor que não pratica o mal contra o próximo” (Rm 13:10).
“Axé pra quem é de axé
Saravá pra quem é de saravá
Aleluia pra quem é de aleluia
Amém pra quem é de amém
Shalom
Namastê geral

Ai!”
Por, Guilherme Lemos – sou negro historiador. Raça, identidade e sociedade são meus interesses